domingo, 3 de agosto de 2008

Líderes ou ditadores

Foto do autor: Izaias Resplandes

Acampamento Rio dos Crentes, Poxoréu, MT




Introdução. O poder é o desejo que arde no coração de todas as pessoas. Mesmo os mais humildes e recatados o possuem e o exercem. É o resultado da ação humana no mundo, aparecendo de forma mais acentuada nas pessoas dos líderes e dos ditadores. Sábia é a pessoa que sabe usar o poder que possui, conciliando o seu exercício com o das demais pessoas. A sociedade, com o objetivo de assegurar o pleno direito de suas liberdades tem por hábito transferir uma parte de seus poderes individuais àqueles que se consagram como líderes. Alguns destes, por seu turno, insatisfeitos com o poder que recebem, usurpam o mais que podem das prerrogativas de seus liderados, impondo-lhes o governo do seu ponto de vista, da sua forma de agir, da sua pessoa, etc. Quando isso acontece, deixam de ser líderes e passam à condição de ditadores. A história está repleta tanto de uns, como de outros, implicando uma tomada de consciência individual, em cada tempo e lugar, sobre os fundamentos e as formas consagradas para o exercício do poder, a fim de que se possam valorizar aqueles que são úteis e repudiar aqueles que maculam a nossa memória coletiva.

1. Os fundamentos do poder. O poder é uno e indivisível. Originariamente, vem de Deus. Foi o divino que, ao criar o homem, o dotou de competência para agir sobre a criação. Deus deixou ao homem o poder necessário e suficiente para que este continuasse a sua obra criadora, desenvolvendo tanto as suas próprias potencialidades latentes, como aquelas que ficaram impregnadas na matriz da criação divina. Cada fragmento dela traz em si toda a plenitude do poder. Foi dessa forma, por exemplo, que o homem desenvolveu a capacidade de recriar os seres vivos a partir de seu DNA, como ocorre atualmente no processo de clonagem e de reprodução artificial.
O poder do homem, portanto, vem de Deus. É um dom divino que cada um, de forma regular, deve exercer na medida de suas limitações e necessidades. É de destacar que, qualquer tentativa de exercê-lo além desses limites, constitui uma afronta ao Criador e a toda a criação. “Toda precipitação ou artificialização desse processo natural pode ser entendida como uma violação à vida, sendo um desafio para os cristãos e a igreja a reflexão sobre a ação da cultura humana sobre os dados originais da criação”[1][2].
Só o conhecimento das essências, preservado por Deus em sua Palavra e na própria natureza da criação, pode garantir um bom domínio e exercício dessa força transformadora, a qual, abaixo do Supremo, também pode ser exercida pelos anjos, demônios e seres humanos. A falta de sabedoria implica no mau uso e em conseqüências reprováveis e indesejadas. O homem deve procurar o conhecimento dos fundamentos, das essências e dos princípios de todas as coisas. A sabedoria do prudente é entender o seu próprio caminho, mas a estultícia dos insensatos é enganadora[3].
É fundamental que um bom líder deva ter uma boa formação, vivências e experiências no uso do poder, para que não venha se transformar em um indesejável ditador da ignorância, que, não tendo outra forma de se fazer respeitar, usa da força bruta e irracional para se impor sobre os mais simples e humildes do povo. É assim que, do ter ou não ter o conhecimento das essências, surge o bom e o mau uso do poder, a liderança e a ditadura, as principais formas de condução das massas populares[4].

2. As formas de exercício do poder. Liderar é puxar a fila, ir à frente, conduzir o grupo, dar o exemplo. O dicionário Priberam da Língua Portuguesa On line define o verbete como: “dirigir na função de líder; chefiar; orientar; governar; ter o primeiro lugar entre competidores ou concorrentes”[5]. Liderar é a principal função de um líder. É o contrário de ditar, impor, como faz aquele que é chamado de ditador e que, segundo o Priberan é o “antigo magistrado romano que exercia poder absoluto; indivíduo que, temporariamente, concentra em si todos os poderes do Estado; por ext. pessoa autoritária, despótica, que usa de prepotência”[6].
Todos os homens nasceram para liderar, agir, fazer e governar. Diz a Bíblia que Deus criou o homem à sua imagem: homem e mulher. E os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra[7]. Tanto os líderes quanto os ditadores surgiram da evolução natural do exercício desse princípio com ou sem sabedoria.
É de destacar que a sabedoria do bom governo foi dada ao homem em essência. Cabia-lhe, desde o princípio, descobrir as melhores formas. O problema é que, no caminho das melhores o homem haveria de encontrar-se com as formas deturpadas, podendo vir a se apaixonar por elas. Então, já naqueles tempos primitivos, o Senhor advertiu o homem quanto a essa busca pelo conhecimento, dando-lhe a seguinte ordem: “de toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás”[8].
É claro que o homem não ouviu a voz do Criador. E tudo o que fora previsto aconteceu. O homem fez sua escolha e Deus não o impediu de efetivá-la, mantendo-lhe a prerrogativa do livre arbítrio. Assim foi que, a partir daquele momento, o homem enveredou-se pelos seus próprios caminhos e pensamentos, deixando o Senhor de lado, apesar de que Ele mesmo, nunca deixou de olhar e assistir ao homem em seus devaneios no uso do poder, esperando que um dia ele retomasse ao bom caminho[9].
O homem desenvolveu diferentes formas de governo. Submeteu-se aos patriarcas[10], aos juízes[11], aos reis[12]. Alguns foram bons líderes; outros seguiram os caminhos da maldade e se tornaram ditadores e fizeram o povo pecar e se distanciar ainda mais do seu Criador[13]. Cada um seguiu as suas próprias razões e fundamentos[14]. Finalmente, cumprindo o seu próprio plano, elaborado na eternidade, Deus veio ao mundo para governar os homens. Veio na pessoa de Jesus Cristo[15].
O governo divino, no entanto, é espiritual. O Senhor governa os corações dos homens, para que exerçam a liderança com sabedoria, respeito e humildade, para que sejam bons líderes[16].

Conclusão. É de ver que nesses tempos de eleição surgem diversos candidatos a líderes. Eles são de todos os tipos e siglas. É hora de aplicar o conhecimento da Palavra de Deus para fazer as escolhas adequadas. Existem bons líderes. Esses são conhecidos pelas suas obras a serviço da sociedade. E existem os maus líderes, os quais nunca fizeram nada, mas que agora prometem fazer um mundo melhor para todos nós. Esses não são bons líderes. A Bíblia fala desse tipo de gente e nos alerta quanto a eles[17].
É dever de cada um estudar e conhecer o poder do Senhor que foi dado aos homens para governarem o mundo[18]. É preciso analisar a forma como os homens exercem a liderança. Todos são potencialmente líderes, mas só é verdadeiramente líder aquele que desenvolveu as suas potencialidades, sendo modelo e exemplo para os demais.
Antes de votarem nesse ou naquele candidato, analisem o seu perfil, conheçam a sua vida, as suas práticas e as suas vivências. Todo mundo tem uma história. Qual é a dele? Vejam como ele se comporta em relação aos demais. Ele tem amor no serviço ao próximo? Tem dedicado a vida para servir à sociedade ou apenas está atrás de um emprego melhor remunerado? É preciso ter cuidado com os falsos líderes, que só pensam em dinheiro e poder e não querem saber de nada referente ao povo.
O líder deve ter uma relação direta com o liderado. Ele o ama e respeita, porque tem consideração por ele. Ele se alegra com os seus sucessos e sofre com os seus dissabores. É de observar que temos hoje muitos ditadores. São pessoas que nunca estiveram a serviço do povo, que nunca tiveram a sua aprovação para nada, mas que nesses tempos surgem como candidatos para conduzir os interesses populares.
Sei o quanto é difícil instruir as pessoas, principalmente quando elas não querem ser instruídas. Os homens nessa condição comportam-se como analfabetos políticos. Mesmo tendo olhos, eles se recusam a ver. É didática a lição de Bertold Brecht[19]. Segundo ele: “O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, Pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais”.
Não podemos nos calar. Aqueles que foram chamados para ensinar devem insistir no exercício de sua missão até o fim. Essa é a doutrina divina do serviço, mesmo que não se consiga obter os resultados desejados[20]. Devemos continuar trabalhando nesse sentido como o estivéssemos fazendo para Deus. Que Ele abençoe a todos.

Poxoréu, MT, 03/08/2008.

Notas íbliográficas e bíblicas:
[1] IGLÉSIAS, José Carlos. Ação pedagógica transformadora: pela construção de uma ética da responsabilidade no ministério. In: KOHL, Manfre Waldemar; BARRO, Antônio Carlos. Ministério pastoral transformador. Londrina (PR): 2006, pp. 185-217.
[2] Cf. Sl 62:11; Mt 22:29; Jo 19:10-11
[3] Cf. Sl 19;1; Pv 14:8; 2 Ts 2:9.
[4] Cf. Tt 1:7; 1 Pe 4:10.
[5] LIDERAR. Disponível em: <>. Acesso em 03/08/2008.
[6] DITADOR. Idem.
[7] Cf. Gn 1:28.
[8] Cf. Gn 2:16-17.
[9] Cf. At. 14:15-16.
[10] Cf. Jo 7:22; At 2:29; 7:8-9.
[11] Cf. Nm 25:5; Dt 1:16. Jz 2:18.
[12] Cf. Dt 17:14; 1 Sm 8:5.
[13] Cf. 2 Rs 17:21.
[14] Cf. Sl 107:4; Is 53:6; Mt 9:36; 1 Pe 2:25.
[15] Cf. Jo 1:11; 18:37; 19:19; Ap 1:5.
[16] Cf. Mt 2:6; Lc 22:29; Rm 15:12; Fp 2:10; 1 Pe 4:11; Jd 1:25.
[17] Cf. Jd 1:4.
[18] Cf. Jo 5:39; 2 Pe 2:20; 3:18.
[19] BRECHT,Bertold. O analfabeto político. Disponível em: . Acesso em 03/08/2008.
[20] Cf. Mt 1:22; Tg 3:1.


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